17 de dezembro de 2013

O que são e representam as Organizações Sociais (OSs)?

A Medida Provisória nº 1591, de 1997, definiu as Organizações Sociais como instituições de direito privado sem fins lucrativos, que seriam parceiras do Estado, podendo abranger as atividades não exclusivas do Estado, como ensino, pesquisa, tecnologia, meio ambiente, cultura e saúde. Em 1998 é aprovada a Lei 9.637 que regulamenta as OSs.

A partir da legislação formulada, as Organizações Sociais ao gerenciar um serviço público podem:

a) Contratar trabalhadores através do regime CLT, ou seja, sem concurso público. Esta é uma forma de acabar com o direito de estabilidade no emprego, algo próprio do funcionalismo público. Os trabalhadores ficam a mercê das verbas transferidas pelo governo para as OSs, e também dos jogos políticos que envolvem o contrato. Caso haja corte de verbas, o contrato seja cancelado, ou exista qualquer outro interesse da OS, muitos trabalhadores podem ser demitidos de uma hora para outra. Além disso, o regime CLT amplia a competição entre os próprios trabalhadores, os quais sempre estão pressionados a se sujeitar aos interesses do empregador e não necessariamente do serviço. O regime CLT também aprofunda a divisão entre os trabalhadores, já que existem funcionários públicos e celetistas trabalhando juntos, os quais possuem necessidades e interesses muitas vezes diferentes. Além disso, os celetistas possuem maior dificuldade em lutar por seus direitos, já que podem ser facilmente demitidos. Por fim, uma última questão com relação ao regime CLT, é que este tipo de contratação permite o empreguismo e o favorecimento político.

b) Os servidores públicos podem permanecer no serviço quando a OS passa a gerir o mesmo, mas deve-se salientar que estes servidores passam a desenvolver atividades para o setor privado. 

c) As OSs, a partir do contrato de gestão, recebem recursos orçamentários do governo. No entanto, mesmo as OSs sendo instituições privadas, as mesmas não necessitam de licitação.

d) Não há algo que regulamente as compras e contratos feitos pelas OSs, ou seja, estas instituições podem usar o dinheiro público da forma que quiserem.

e) A OS não necessita prestar contas sobre seus processos de contratação e aquisições de bens e serviços a nenhum órgão de controle da administração pública, já que estas são atribuições do Conselho de Administração, composto por membros que em sua maioria é indicado pela própria OS. Desta forma, pode-se constatar a falta de transparência no uso de recursos públicos pela OS.

A fiscalização do Estado se dá através de uma comissão de avaliação, que avalia os relatórios elaborados pela OS. Estes relatórios têm como central dados referentes ao cumprimento das metas.

A partir dos mecanismos de funcionamento das OSs citados acima, pode-se compreender como estas entidades sem fins lucrativos lucram. Afinal, estando tudo sobre controle do Conselho de Administração, o excedente de verba pública pode ir diretamente para os bolsos dos dirigentes das OSs, como forma de remuneração. 

Quando a Lei das OSs estabelece que sejam qualificadas nesta condição somente as entidades privadas sem fins lucrativos, assim como a Lei das OSCIP, mas concedem aos seus respectivos Conselhos de Administração a prerrogativa de dispor sobre o plano de cargos e salários e benefícios dos seus empregados, estão dispondo, em outras palavras, da possibilidade de utilizar-se de eventuais excedentes operacionais, brutos ou líquidos, dividendos ou bonificações, auferidos mediante o exercício de suas atividades, distribuindo-os entre os seus sócios ou associados, conselheiros, diretores ou empregados, na forma de suas remunerações, tais como em salários, gratificações, auxílios e benefícios diversos.

Com todos estes privilégios, a participação da iniciativa privada que, segundo a Constituição Federal, era para acontecer de forma complementar no SUS, acabou tomando conta de quase todo o sistema de saúde nos municípios e estados que criaram as condições de existência das OSs. O que ocorreu, de fato, com as terceirizações previstas na Lei das OSs foi a transferência, pelo Estado, de suas unidades hospitalares, prédios, móveis, equipamentos, recursos públicos e, muitas vezes, pessoal para a iniciativa privada.

As Organizações Sociais na Saúde
O governo do estado de São Paulo e, agora, o prefeito Paulo Alexandre Barbosa, afirmam que as Organizações Sociais permitem maior infraestrutura, qualidade de serviço e produtividade com menor custo, em comparação com a administração pública. Porém, é preciso ressaltar que esta produtividade é baseada em metas traçadas a partir de uma lógica empresarial, o que é estranho à produção de saúde. Isso porque a promoção de saúde deve estar relacionada com a necessidade dos usuários de saúde e não a números previamente calculados, ou seja, a metas. 

Deve-se constar também que a carga de trabalho é maior, já que a precarização dos direitos trabalhistas e a falta de estabilidade no emprego acabam sendo elementos de pressão para o trabalhador apresentar maior produtividade sem remuneração equivalente. 

Além disso, há outra questão que precariza ainda mais o trabalho. Trata-se da quarterização, ou seja, a contratação de empresas por parte da OS. Como a empresa quarterizada recebe uma parte da verba que é repassada para a OS, provavelmente os níveis salariais da primeira são ainda menores e a precarização é ainda maior. É importante ressaltar que geralmente as empresas quarterizadas são responsáveis por setores mais precarizados, como o de limpeza, em que os salários são extremamente baixos, a carga horária de trabalho é enorme e não há qualquer garantia de direitos trabalhistas.

Por fim, é preciso ressaltar como as OSs desrespeitam os princípios do SUS encontrados na Lei 8.080, tais como:

a) Descentralização: a descentralização deveria ocorrer no sentido da municipalização. Com as OSs o que ocorre é a fragmentação na mão da iniciativa privada. Isso ocorre da seguinte forma:

Regionalização: não existe com as OSs, já que em uma mesma região pode atuar OSs diferentes, cada uma operando de forma autônoma.

Hierarquização dos serviços: já que cada OS tem autonomia em relação a administração direta e ao SUS, o sistema de referência e contra-referencia fica amplamente comprometido, pois os diversos serviços são de OSs diferentes. 

b) Financiamento das três esferas de governo segundo o tamanho e as necessidades da população: financiamento definido no orçamento público, para cada OS, conforme a influencia política de seus dirigentes, com contrapartida da entidade’ por meio da venda de serviços e doações da comunidade e com reserva de vagas para o setor privado, lucrativo” (Rezende, 2008). Vale ressaltar que o financiamento está atrelado ao cumprimento de metas.
c) Integralidade: para este princípio se efetivar, é necessário que exista um conjunto de ações em saúde que se relacionem entre si. Com as OSs, somente serão implementadas as ações exigidas pelas metas, ampliando a fragmentação das ações em saúde e dificultando a constituição da rede. 

d) Participação da comunidade: os Conselhos Locais de Saúde são substituídos pelos Conselhos de Administração, já que este último tem total autonomia para definir como utilizar os recursos públicos.

1 comentários:

se com programas de transparência estamos assistindo o "caos" podemos imaginar o que está por vir em um sistema sem prestação de contas,onde não haverá estabilidade funcional e nenhum comprometimento com a sociedade.

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